quarta-feira, 2 de junho de 2010

EU INVISÍVEL

Sentado bem ali, eu via todos passarem.
Andares apressados, olhares frios, duros.
Olhos sempre fitados no horizonte.
Mas que horizonte, se estão em meio a uma aglomeração?
O que estão olhando?
Tento ver algo, más nada vejo.
Levanto-me. Ops foi mal.
Ué? Estão mesmo fazendo isso?
Será que entendi?
Estão desviando de mim?
Calma gente estou bem aqui.
Vejo todos, não vou me chocar contra ninguém. Essa noite apenas dormi aqui, e bem no chão, junto a esses colegas que me acolheram sem perguntar de onde vim.
Resolvi sair da rodoviária e ver como segue a vida por ali.
Olha o Bruno, aquele que me recebeu ontem à noite. Como o coitado é ignorado no semaforo.
Aquele revoltado é o André, olha só.
Na noite passada ele falou como estava cansado de ser ignorado pelos que tem dinheiro.
Que isso cara? Não precisava chutar o carro, só por terem fechado o vidro.
Não consigo me encontrar, os colegas agridem aos que os ignoram.
Alguns descobriram que fazem parte do segmento invisível da sociedade.
Agora parece que somos invisíveis.
Quando tem visita de autoridades, logo somem conosco.
Passam por cada um de nós, e nos ignoram. É como se não existíssemos.
Ainda perdem tempo com sociólogos tentando entender por que existe a prática da violência próxima às suas residências.
Esquecem-se de que meus colegas estão apenas provocando. Querem ser vistos, lembrados.
Estamos aqui. Não somos invisíveis.
Ao passar por um de nós, não finja que não nos viu.
Estamos aqui. Somos fruto da mesma sociedade, mudando apenas o berço em que nasci.
A simples atenção do teu olhar já me faz sorrir, me inclui, me gratifica.
Vai, me tira daqui.
Nem é necessário levar meu corpo daqui, basta transportar meu ego, me estimular a tirar minha alma daqui.
Não quero a invisibilidade, apenas sair daqui.
Vai. Olha-me, me entende.
Me vê.

Um comentário:

  1. Esse é um tema interessante para se debater. Trata-se de inclusão social. Tornar as pessoas invisíveis em visíveis trás uma série de benefícios à sociedade, principalmente em se tratando segurança. Essa transição de invisível em visível é bastante problemática.
    Envolve liberdade: o direito de fazer o que a lei permite.
    Muitos destes invisíveis fogem desta liberdade de viver dignamente em sociedade, de procurar fazer aquilo que a lei permite.
    Por mais que se tente resgatá-lo, ele voltará para a rua, não vai querer ser enxergado.
    Será que ele optou em não ser enxergado, em ser invisível. Nesse caso parece que ser ovo indefinidamente não seja uma ótima opção. Ser bacon vale a pena não só para si, mais também para a sociedade que se faz parte.

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